“O desenho é a única linguagem que não necessita de tradução”. A frase é de Campelo Costa, que comemora 50 anos de sua primeira mostra individual com a exposição “Campelo Costa: traços de um percurso artístico”, de 9 de agosto a 6 de setembro, na Galeria Vestigium. A mostra tem a curadoria de Roberto Galvão e reúne 40 obras recentes do desenhista.
Registros de memórias da infância no sertão, de visões de paisagens urbanas colhidas nas viagens do artista pelo mundo e cenas de festa imaginárias norteiam as obras expostas por Campelo Costa. Perito em desenhos de campo, registra tudo o que vê com lápis e papel, não utilizando câmeras fotográficas. À maneira dos artistas viajantes dos séculos passados, em pleno século XXI, Campelo é um rabiscador incansável das cidades que visita, da gente que vê, dos bares que frequenta. Os traços de seus desenhos são verdadeiros poemas visuais que, ao mesmo tempo, são registros de instantes, experiências e conhecimentos adquiridos ao longo de sua história de vida.
O surgimento de seu trabalho na década de 60 impressionou e causou um grande impacto no universo intelectual das artes plásticas no Ceará, obtendo em três anos seguidos o primeiro prêmio de desenho do Salão de Abril (1966, 1967 e 1968). A exposição “Campelo Costa: traços de um percurso artístico” marca os 50 anos de sua primeira mostra individual, realizada em 1968.
Na abertura, dia 9 de agosto, às 19 horas, será lançado também o catálogo da exposição, que apresenta a trajetória do artista, de sua capacidade inata de construir, desde menino, perfeitas perspectivas, intuitivamente, sem guardar a menor preocupação com os rigores técnicos. “O desenho investe, estrutura o projeto. Há nessa atitude o sentido de atirar‐se para frente. Nunca é arbitrário”, traduz Campelo no texto presente no catálogo.
“O Campelo Costa se insere na dinastia de grandes desenhistas do Ceará, como Raimundo Cela, Aldemir Martins, Floriano Teixeira e Marcos Francisco. Ele é um homem que dignifica a produção artística do estado. Acredito que essa exposição vai impressionar as pessoas. Apesar de tratar da mesma temática há décadas, a produção dessas obras traz uma evolução gráfica”, destaca Roberto Galvão.
São obras recentes do artista, divididas em três temas que Campelo Costa trabalha desde o início de sua carreira: Sertão, Festa e Paisagem. Segundo o curador, os desenhos de Campelo têm traços por vezes precisos, outras vezes nervosos, mas sempre na justa medida, corretos, como se de muito tempo já estivessem construídos em sua mente. “Parece que o seu espírito salta por sua mão”, diz Galvão.
Cenários
Em “Sertão”, as obras de Campelo retratam a infância do artista em Belo Jardim, onde nasceu, no agreste pernambucano, relativamente rústico. Os desenhos apresentam um universo carregado de tradições populares, como feiras, procissões, vaqueiros, beatos, entre outras atividades que são reflexo da identidade cultural do povo nordestino.
No universo “Festa”, as obras apresentam traços mais eróticos, musicais e também de festas do sertão. Nos desenhos é possível perceber a impregnação da melodia e do ritmo no resultado gráfico, que conta com registros de flagrantes de bandas musicais em ação ou de músicos isolados em atuação. Aqui também há imagens de festas profanas, religiosas, folclóricas e tradicionais. Nessa temática, o curador apresenta uma curiosidade ao destacar que as cenas de festividades religiosas são claras, leves em contraponto às cenas profanas bem mais escuras.
Já em “Paisagem”, o artista apresenta registros das paisagens construídas. São mergulhos visuais feitos em viagens. Nesse campo, estão seus cadernos de folhas avulsas, item indispensável em suas viagens, com desenhos realizados sem intenções projetivas. Nos registros não há desenhos de apresentação de projetos arquitetônicos. São registros de paisagens urbanas sob o olhar do artista. Mesmo nos traços simples ele faz arte. Em quaisquer anotações dos seus cadernos de viagem, a arte sempre está presente de modo determinante.
O artista
Antônio Carlos Campelo Costa, desenhista e arquiteto, realizou os primeiros voos no universo do desenho ainda menino quando foi morar com a família na Base Aérea de Parnamirim. Transferiu-se para Fortaleza, onde começou os trabalhos como desenhista. Participou de três Salões Municipais de Abril, sendo agraciado com os prêmios de melhor desenhista de 1966, 1967, 1968. Formou-se em Arquitetura e Urbanismo em 1972, pela Universidade Federal do Ceará.
Nos anos de 1969 e 1971, foi premiado com trabalho em equipe na Bienal Internacional de São Paulo, na categoria de Arquitetura. Nas décadas de 1980 a 1990, realizou exposições individuais de desenhos, sendo premiado em 1997 no Salão Norman Rockwell, promovido pelo IBEU-CE. No mesmo ano, comemorou três décadas de participações em exposições com a mostra “Campelo Costa: Personalidade, Músicos, Eros, Arquitetura”.